terça-feira, 7 de dezembro de 2010

A TRADIÇÃO DAS TRÊS CORES

terça-feira, 7 de dezembro de 2010 0
Por Flávio Leite

40 minutos do segundo tempo. O Fluminense vence o Guarani por 1 x 0. Após 26 anos, o tricolor está próximo de se tornar campeão brasileiro de 2010. Mas, o shopping está tranquilo, tranquilo. Parece que nada está acontecendo. O jogo segue emocionante no telão, porém raramente alguém solta um grito eufórico ou faz um festejo maior. Vez por outra, alguns foguetes estouram lá fora, mas nada muito contagiante. O Árbitro Carlos Eugênio Simon acaba de erguer os braços. Não há mais dúvidas: o Fluminense acaba de se tornar campeão. O shopping continua tranquilo. Um fluminense aqui, outro ali. Nem de longe, lembra a festa rubro-negra de 2009. Evidente Amigos, a torcida Pó-de-arroz é mesmo diferente. Parece pequena, cismada, elitizada. Por exemplo, a palavra Flamengo lembra Zico; Botafogo lembra Garrincha; Vasco lembra Roberto Dinamite; Fluminense lembra quem? Fluminense, amigo, lembra: Nelson Rodrigues, Mário Lago, Jô Soares, Chico Buarque... Por falar em Nelson Rodrigues, hoje o Jornal O Globo anotou a seguinte manchete DE 99% REBAIXADO A 100% CAMPEÃO. Agora veja o que Nelson escreveu, em 16 de junho de 1969, no mesmo jornal: Acreditem: — o Fluminense começou a ser campeão muito antes. Sim, quando saiu do caos para a liderança. “Do caos para a liderança”, repito, foi a nossa viagem maravilhosa. Lembro-me do primeiro domingo em que ficamos sozinhos na ponta. As esquinas e os botecos faziam a piada cruel: — “Líder por uma semana”. Daí para a frente, o Fluminense era sempre o líder por uma semana. A verdade é que FLU começou a ser campeão quando o técnico Muricy Ramalho - vencedor de quatro brasileiros nos últimos cinco anos - deixou de servir à seleção brasileira para servir ao clube.

domingo, 28 de novembro de 2010

O CANTO DA ESQUINA

domingo, 28 de novembro de 2010 0



Deixe-me aqui, neste canto desafinado

É uma esquina rouca, quase muda

Mas nunca sai deste canto

Ainda que eles tapem os ouvidos

Esqueça-me aqui, neste canto desentoado

É uma aresta fria, quase um gelo

Mas nada agasalha o meu canto

Nem mesmo eles, tão frios

Largue-me aqui, neste canto sem sorte

É uma quina sem ganhador, quase um gasto

Mas este é meu único canto

Ainda que eles tentem me calar

Abandone-me aqui, neste canto malsoante

É um vértice faminto, quase uma cratera

Mas, neste canto eu espero

Que um dia eles me ouçam, em breve ou semibreve



Poema: Flávio Leite
Desenho: Wesley Rodrigues

Subconscientemente


Mente a sua mente
Quando esquece facilmente
Dos bons e velhos camaradas
De quão longa jornada
Que se fazem presentes
Verdadeiramente: presentes
No abraço oxigenante
No ombro apoiante
Ante o peso lacrimal
Vertido sobre um peitoral
Que inevitavelmente carrega
Per fuma e rega
Um coração quebrado pela ira
De uma imprudente mentira
Mente sua mente mente
Quando olvida ingratamente
Dos grandes companheiros
Que se fazem herdeiros
Das lembranças mais ensolaradas
Destas longas caminhadas
Outrora e sempre presentes
Verdadeiros: Presentes
Oh mente doce!
Por que mentes docemente?
Peço-lhe simplesmente
Não se esqueça desses Entes
Para não quebrar-me esta rima de repente
Se o esquecimento é algo indiferente
Esquece-me então a dor de dente
A dor latente,
A dor ardente...
Pois o esquecimento é
Uma calúnia de mente
Esquecer-se de algo importante
Não é lá muito elegante
calma! Nada está perdido
Ou na alma está inocivo
Ou despertará no inconsciente coletivo

Poema: Subconscientemente Autor: Flávio Leite
Desenho: Wesley Barbosa

Dos esquecimentos

Ando meio desligado.
Acabei por esquecer umas coisas
que tinha de esquecer.


Flávio leite

Das sacanagens

Após três km de corrida,
alguém brinca:
estás com uma barriguinha aí!

Flávio Leite

Dos psicanalístas

Psicanalista: um amigo profissional
que prostitui o cérebro.
Ele o ajuda a permear dramas do quotidiano
através de técnicas analíticas e arqueológicas.
Seu trabalho consiste em ouvir, observar,
interpetrar, devolver o que você disse
e ganhar os créditos de uma possível melhora.


Flávio Leite

Das mexericas

Há várias luas minguantes ensolaradas
dentro de uma mexerica.

Flávio Leite

Poeminha

Olho-me no espelho, um pesadelo me abraça
Meus cabelos, que eram pretos, estão da cor de fumaça
Eu não quis gastar com tinta
E o Tempo pintou de graça

José Vitorino Leite (avô)

segunda-feira, 31 de maio de 2010

O PONTO CEGO

segunda-feira, 31 de maio de 2010 0
Sinalizei para ter acesso à faixa da direita. Já estava a entrar quando, de repente, um carro se materializou no retrovisor. Confesso: caí na famosa pegadinha do ponto cego. Puxei o volante e voltei para a minha mão. O sujeito buzinou, gesticulou, olhou de cara feia, xingou, descarregou a raiva do chefe, da sogra, do cunhado e do chefe novamente. Em outra manhã, levantei-me da cadeira de réu e sentei-me na de juiz. De peito estufado, fui o dono da razão pelo menos por uma manhã. O carro da frente foi entrando como se eu estivesse invisível. Buzinei, xinguei, mostrei o dedo do meio -completamente ereto - e concluí: - até o talo seu filho... Sabe porque fiz isso? Eu também não sei. Mas, me pareceu muito natural. A humanidade parece mesmo caminhar nesta rota da intolerância, da intransigência, da irracionalidade. Em breve, não haverá mais "serendipicidades". Será o fim das descobertas afortunadas feitas em virtude do acaso? Ora, é sabido que o acaso necessita da falta de motivos, de explicações e até dos erros. Quantos casais se formaram após uma batida de carros? Quantos mendigos encontraram notas suicidas de R$ 50,00 que se jogaram de algum bolso desapercebido? O erro, obrigatoriamente, deverá entrar em extinção. O mundo, finalmente, será dos espertos. E, sobre a terra, restará apenas um bando de sem vergonhas, urrando, batendo no peito, arrastando as fêmeas pelos cabelos e carregando tacapes. Não cairemos mais na pegadinha. Seremos os próprios pontos cegos.
 
Rota do Infinito. Design by Pocket